Com este Setembro que nos entra pela manhã adentro...




Todas as manhãs o sol entrava pelas janelas da fachada sul do andar, um valor seguro. Um valor certo e pontual, ainda que esse amigo dos seus silêncios se viesse, por vezes, vezes demais, a esconder-se e a dar-lhe o cinzento do céu, quando mais lhe apetecia estudar e contemplar as sombras que a luz amarela e forte e quente projectavam nos umbrais das janelas e no piso da rua.

De valores seguros sentia já muito distanciamento. A vida ia-lhe dando lições e provas, e pondo-o à prova. A amizade, sim era um, mas em momentos mais difíceis, essa, parecia que se lhe escapava, como água a escorrer pelos dedos. Talvez transparente e pura como a água, talvez também certa e segura, sempre na sua mesma forma e estado, sempre existente, mas...nem sempre presente. 

O amor era um dos valores mais certos e é-o, independente de barreiras, fossem elas quais fossem, mas era o mais exigente também e, também, lhe exigia dedicação e alimento, tomasse a forma que tomasse.

Isto vinha-lhe aos poucos, entrava-lhe como o sol, atravessando os vidros das janelas que o separavam da rua, mas não dessa luz fantástica e pujante de uma manhã de Setembro. Chegavam-lhe memórias, selectivamente, pois filtrava as outras, as residuais mas não persistentes, de que não queria mais saber. Com esse sol de manhã de Setembro queria apenas, como o vidro dessa janela, que só era permeável a um certo tipo de radiações, ser também complacente com as memórias boas. 

Há memórias que nos dizem como pode ser o dia de hoje, mesmo que se refiram, como é o caso, a algo que já só está na nossa cabeça. Por memórias boas deve entender-se as únicas que nos podem ajudar, hoje e amanhã. Mas todas elas são a nossa escola pessoal, o nosso ensinamento individual e aprendizagem, quase, exclusiva. Quando nos vemos em momentos de silêncio, o amigo cão a nossos pés, somos suavemente empurrados, com frequência e repetidamente, a vermos o filme das nossas vidas. 

Esse sol pela janela...também o levava a desejos, sonhos e aspirações...

...um dia, gostaria de ser um escritor autêntico. Sim, escritor. E, no entanto sabia que nunca o seria. Sabia, é uma forma de dizer, pois do futuro sabe-se apenas o que podemos hoje tentar construir e preparar dele. Precisamente com tudo o que já nos foi ensinado e os erros e coisas certas que se foi fazendo. Mas ainda mais com a vontade...que esse sol brilhante e forte lhe transmitia em energia, tanto quanto em determinação. 

Como alguém um dia disse...repetia ele, olhando para fora, uma vez mais o sol a chama-lo às coisas boas e positivas e melhores que soubesse viver, um dia faria...um dia seria...só não sabia exactamente quando. E queria sê-lo e faze-lo com todos aqueles que hoje o acompanhavam, ao perto e ao longe, pois também os devia haver. 

Um dia...num outro dia, mas com esse mesmo Sol, seguro e certo das manhãs todas...

Comentários

Anónimo disse…
Bem escrito e com um conteudo muito denso e Forte de Sentimenos!!
Talvez com um propósito defenido.

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