Lixo

Todo o nosso corpo consome nutrientes, água e energia. E também produz. E produz lixo, em cada canto do nosso corpo. No cérebro também.

O cérebro consome 25% de toda a energia que temos como reserva, e pesa apenas 2% de toda a massa corporal.

http://www.ted.com/talks/jeff_iliff_one_more_reason_to_get_a_good_night_s_sleep?utm_source=newsletter_weekly_2014-10-18&utm_campaign=newsletter_weekly&utm_medium=email&utm_content=talk_of_the_week_button#t-553079

O cérebro funciona a partir de uma química especial, desenvolvida com a evolução humana, para o seu próprio funcionamento, que nos permite armazenar não apenas os pensamentos por nós gerados, mas muito, imensamente mais: o que herdámos culturalmente (os memes que nos foram transmitidos, desde gerações de progenitores que desconhecemos, até aos conhecidos deles, que com eles interagiram. Somos efectivamente um animal social. Somos feitos do que por nós fizemos, e do que todos os que conhecemos e não conhecemos, antes de nós e ao longo da nossa vida, nos passaram. Os memes), o que vamos experienciando ao longo da vida, por contactos feitos e por pensamentos e ideias concretas, mais ou menos, por nós gerados. Todo o funcionamento do cérebro tem uma expressão física e uma expressão química.

Durante a noite o nosso cérebro precisa de "se limpar", expulsando nutrientes (química) que não foram utilizados, ou sub-produtos do que foi gerado em cada uma das suas células. Tal como todo o nosso corpo. Se não dormirmos, o cérebro não entra nesse processo e pode acumular, mais tempo do que o necessário, um quase-lixo, sub-produtos, que podem ser-nos prejudiciais. E não se faz a reorganização de tudo o que o dia deu ao nosso cérebro. Nem das ideias, vivências, já desnecessárias.

Isto quer ainda dizer, que precisamos de deitar fora, literalmente pensamentos "em excesso". Num processo natural, fazem-lo, mas a maioria das vezes somos tentados a guardar grande parte do que já nem nos útil, menos ainda favorável.

Posso enganar-me, dado esta ser uma interpretação livre, e meramente pessoal, mas é um pouco o que  fazemos quando nos agarramos a muitos hábitos, rotinas e tradições. Parte, são mecanismos quase automáticos, meio-pensamentos, trabalho do inconsciente e muito pouco do consciente. Parte, no entanto, pelo que tenho observado pela vida, são "ideias" que forçamos. O "que tem de ser, porque sempre assim foi" e as tradições a que nos agarramos. Por isso sou bem mais favorável a uma espécie de purga mental pessoal, refazendo ideias, aceitando novas, tentando não me agarrar a "ideias feitas", porque me assusta essa falta de estratégia mental. E, sobretudo, desagrada. Em muitos temas. Por exemplo, os complexos com temas sexuais que fomos herdando. Não tenho, por mim e para mim, e para aceitar noutros, nada contra ideias como ter relações sem sentimentos, amizades coloridas, e o seu oposto, mais universalmente aceites, como relações tradicionais, como fortes sentimentos envolvidos. A mente aberta facilita-me num aspecto que me esforço por cumprir diária a quotidianamente. A tolerância perante ideias que não tenho como rígidas, ou que as tenho como flexíveis, porque dependentes de partilhas com alguém não necessariamente comungando das mesmas expectativas e pensamentos do que eu.

Mas se o tema do sexo, sendo mais polémico me apraz mais abordar, outros tantos se podem repescar como bons exemplos. Exemplos da criação de ideias que a um tempo farão parte das nossas vidas, sendo-nos úteis e dando-nos prazer, a aos que connosco convivem, como a outro tempo já nos devemos desfazer delas. Como os sentimentos, uma complexidade da mente, gerada em pensamentos, mas muito mais em actividade do inconsciente, do sistema 1 do nosso cérebro.

O lixo de que nos desfazemos todos os dias, não é, por isso, apenas físico. Deve-o ser também mental. E é-o. Efectivamente, reciclamos, ideias, pensamentos soltos, ou mais estruturados. Memórias, essas ficam. A diferença entre o lixo bioquímico que o cérebro rejeita, e para que o processo ocorra normal e saudavelmente, ele necessita de descanso, de noites bem dormidas (sem as quais podem ocorrer fenómenos de acumulação indesejada do que podemos dizer serem alguns produtos tóxicos, e os processos mentais, é que o lixo destes não é definitivamente rejeitado, é reciclado. A gestão dessa reciclagem é a parte que nos define, como possuidores de mentes mais limpas, mais disponíveis, mentes mais "intoxicadas", ou mentes demasiado "ocupadas" com temas, ideias e pensamentos anacrónicos. Acontece muito...por aí. É só nos pormos a observar. E nem sempre pelas más razões. Por exemplo, para auto-protecção, por insegurança, devida talvez a pouca evolução no sentido de pensamentos novos, gerados num processo de recriação, de criação pura, mais incerto, ou inseguro, por falta de padrões de comparação, podemos socorrer-nos de ideias "feitas", de bengalas e apoios, fugindo à aceitação do que é inovador. Deixando a mente bem mais fechada, rejeitando o menos conhecido, ou o desconhecido, perdendo, eventualmente oportunidades fantásticas, por processos decisórios redondos, circulares.

Mente aberta significa risco, mas também um processo de reciclagem mental bem mais ousado, uma aventura para a mente em si, e para nós donos dela. Mente aberta pode significar experiências muito gratificante, ou, evidentemente, caminhos novos de alto risco. Mas como tanta coisa, só sabemos, ousando...(daí eu não apreciar a segurança do habitual, estafado processo de cópia e colagem, herdado sem nos interrogarmos. Prefiro sempre arriscar)

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